quarta-feira, 28 de abril de 2021

 

quando cheguei os sinais eras ambíguos
quando sai restava apenas o silêncio
escova de aço e clorofina para limpar
os pecados da pobreza debaixo do sol
e era como se eu sonhasse com o futuro
e era como se eu revivesse a agonia
dos meus pais e usasse roupas
que nunca foram minhas
e o cachorro calasse o próprio grito
explodindo a cabeça contra o muro –
lixei as unhas nas ranhuras da parede
sem reboco e desatei o nó
experimentando o peso de ser
quando cheguei a casa estava alagada
quando sai restavam apenas cinzas
mas eu estava limpo como quem nasce
pela segunda vez e logo é batizado
na incandescência com que se enxágua 
o piso e os cabelos antes da estreia
quando cheguei a terra sinalizava perversão
quando sai restavam apenas as órbitas vazias
tendo a leveza da ossatura de um fantasma
podendo prescindir do trabalho infame
e da força animal – do animal adulto
que sem dentes ou garras engana a morte
e mergulha nas últimas brasas
na assombração de uma estrutura de lata
e bombril – tentando sintonizar o mundo

luiz carlos quirino 

Nenhum comentário:

Postar um comentário