domingo, 15 de novembro de 2020

 
quando submerge
na embriaguez funda do mundo
 – o eu dos muitos estilhaços
se debate
 
tentando recompor
alguma figura
 
o eu entre mim e o ilimitado
escutando a respiração das coisas
e o espírito em agitação
 
de si ao que finda entre
as moléculas e a harmonia
ao redor de cada existência
 
– morrer e se diferenciar
num único acorde

luiz carlos quirino

domingo, 8 de novembro de 2020

reconheço as estrias – 
como moldam as vogais no fogo
na ferida que não pode ser dita
sem ferir a boca

nos cardumes do sentido
se projetando contra as pedras
represando a língua
espaço vazio entre
mim e a voz

– animal sobre a mesa

vertigem da lembrança
pena apenas do futuro
– casa do esquecimento
e dano – enigma do mal

toalha sobre a mesa
sobre o assoalho em chamas

antes fosse sonho
o que não posso dizer
sem acordar
dento do sonho
ao infinito
e outra vez

luiz carlos quirino


sábado, 7 de novembro de 2020

 

em suma – divido

em duas partes a laranja

sumo do zero à volta

dois dedos contra a fronte

e pareço anunciar uma guerra

sumo da violência e luz

 

regressa ao zero

tudo o que é entorno e

desaparece entre meus dedos

na possibilidade mais sombria

de iluminar o silêncio

 

já não posso

trabalhar com as mãos

sem me envenenar no asco

sem apontar em direção

                 ao déspota

sem perder

as unhas

 

os que ressuscitam

prefeririam não o tê-lo –

voltar ao terror que nunca

termina ou começa

 

corro a tranca dos olhos

que faíscam eletricidade

metálica no rosto


luiz carlos quirino 

 

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

 

insetos chamuscam a noite

que rodeia a lâmpada  

 

durante a queda da tarde

sobre rosáceas e roxos

 

tão fúnebres quanto

o borrão dos minutos

 

na mão da mãe uma sacola

carregada de navalhas

 

cortando os dedos a casa

os móveis e a fala

 

que rodeia a lâmpada

de epidemia


luiz carlos quirino