domingo, 24 de fevereiro de 2019

sequência inconsequente








[primeiro] exortam-se os homens
com as armas mortíferas os dinheiros
e seu ego ao centro
erigindo-se totens em todas as esquinas
exigindo-se gravidade frente aos ídolos
[depois] um quê de desespero irrompe
a partir dos poros envelhecidos
já que os jovens são estranhos
à esperança tanto quanto à espera
[por fim] deus torna-se absoluto e supérfluo
– um flato no universo
causador dos furacões e das guerras
e agora que nos tornamos todos autômatos
em nosso fazer da perversidade
proliferam-se os desafetos e os eletrônicos
e ninguém mais dorme
nem eleva os olhos ou neles olha
assombrados pelas pics
– picada pior que a heroína


LUIZ CARLOS QUIRINO DA SILVA

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

as fronteiras e os limites








(a Pedro Paiva)

onde guardamos
os sonhos não realizados
e quando os perdemos
onde procuramos
vai-se vivendo enquanto isso
[e recordando]
cada dia pesado
como uma promessa
um campo aberto
um mapa
numa língua estranha
numa fronteira
o limite impreciso
entre o que foi dito
e o que jamais poderá retornar
a linha invisível que demarca
o vazio contínuo ao sul
onde o mais difícil
é deixar-se desaparecer
em meio aos desaparecidos
desaparecer-se a si mesmo
no campo vasto
desertificado
fantasmagórico
ruidoso
onde guardamos
os sonhos não realizados
ou perdemos

LUIZ CARLOS QUIRINO



domingo, 17 de fevereiro de 2019

queda livre


sonho que estou caindo
acordo alguns centímetros
____ainda suspenso
as pessoas já se odeiam lá fora
e se atiram em queda livre
a cabeça mergulhada no vácuo
os braços perdendo as escamas
habituados à queimadura da vertigem
e o peso já não se mede numa balança
maior do que a coragem
inferior à memória
a suspeita de que além
_________nada existe
turva-nos a miragem restante
da vida ao outono
do inverno à infância
e novamente o gelo
alguns centímetros suspenso
navalha in natura
e – prematura – a cabeça
transpõe o tempo
e pelo espaço adentro se deixa

LUIZ CARLOS QUIRINO

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019







face rubra e mãos trêmulas
como se houvesse esperança
como se amanhã o dia retornasse
e a vida fosse possível

o mundo é extremo – e caímos sempre

que as olheiras escrevam nos olhos
acostumados ao oco das órbitas

os mortos febris suportam o
peso da terra e o nosso
os ossos por todos os lados
apoiam as casas vazias
vidas breves e velozes
negociadas no escuro
cada qual como um
pequeno relógio obsoleto
os ponteiros de animal
jogado na máquina do mundo
[matadouro contínuo]

o terror vindouro é
página-quebranto
pondo em prática
atávica – errando
com ênfase e
fulguração
full
or

off


LUIZ CARLOS QUIRINO