domingo, 12 de abril de 2020


um gole de água para Allen Ginsberg
antes – a seca assolou nossa geração
que quase desistiu da terra
agora afinal lavrada

pronta novamente para expressar
sua esterilidade em abundância

e eu me vi destituído de minha
própria possibilidade de falar
mas ninguém finge ser fantasma
_______impunemente

mais dia
menos dia

nos damos conta de que nosso corpo
sempre foi translúcido –
projeção imaginada pelos objetos
à luz de sua beatitude

nem percebemos que nossa fala
também já não possuía um corpo
e tudo o que se dizia era sopro sem som
produzido pela anomalia do λόγος comum
presa ao tempo de depurada espera
tempo-todo-nenhum

e as crianças corriam pelas ruas
nada mais do que sonhos nus

mal pude acreditar no delírio
daquele que nos conduzia
– aberrante sem lírica

apenas a violência das imagens
que se chocam contra a dureza
da mentira depurada

poderíamos chorar para sempre
poderíamos dinamitar o parlamento
poderíamos lavar as mãos

ou oferecer água à Ginsberg
_____________e submergir
levitar nas profundezas abissais
do líquido algo taciturno
que envolve a vida



luiz carlos quirino

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